segunda-feira, 4 de junho de 2007

MÁRCIO SOUZA EM ARAGUAÍNA


Não conhecia o escritor Márcio Souza. Era apenas um leitor voraz de sua obra, conhecendo muito da nossa região, o Norte do Brasil, pelas páginas de livros emocionantes como Galvez - o Imperador do Acre e Mad Maria.

Ele esteve em Araguaína, por cinco dias, no final de maio, durante estréia da peça teatral A Maravilhosa Estória do Sapo Tarô-Bequê, de sua autoria, encenada pelo grupo local Ciganu’s. Souza é uma pessoa extremamente gentil, tranqüila, completamente o avesso da agitação e das aventuras com que compõe seus personagens em livros cujo cenário é a sua própria região: a Amazônia. Um escritor que dá destaque à história de seu povo em seus livros, ele acredita que no Brasil existe certo preconceito dos autores em trabalhar temas históricos.

Também acredita que se o país tivesse mais bibliotecas públicas o brasileiro teria mais chances de elevar seu nível de leitura. Para Márcio Souza, quem deseja se iniciar na carreira literária tem que ser perseverante e buscar uma editora do eixo Rio-São Paulo para obter sucesso.

jjLeandro - Araguaína é uma cidade da região Norte. Nos seus trabalhos, o senhor explora muito a temática dessa região. Causou-lhe surpresa a encenação de uma peça sua aqui, numa cidade desconhecida?
Márcio Souza – Não. Não causou surpresa. É uma peça bastante encenada no Brasil e me deixou bastante feliz porque, como disse, é muito encenada, mas raramente é encenada na região. As dificuldades são maiores aqui para fazer teatro, fazer qualquer tipo de arte, principalmente nas cidades do interior. Por isso mesmo quando eles me pediram autorização, eu falei: 'olha, não tem o menor problema', e até brinquei com eles, dizendo 'eu autorizo, mas vocês têm que me convidar para a estréia'. E eles convidaram mesmo. E eu achei ótimo estar aqui para assistir ao espetáculo e conviver com o grupo. Eu faço teatro também e sei das dificuldades.

jjLeandroQuais suas expectativas para o lançamento dessa peça em Araguaína?
Márcio Souza – A experiência que eu tenho com o Sapo Tarô Bequê é que ele é um espetáculo que atrai público. Onde ele foi encenado, em geral, agradou. É comédia. O brasileiro é ligado aos temas cômicos, não gosta muito de drama e tragédia, e, pelo fato de ser comédia, já tem meio caminho andado para interessar ao público. Depois tem o poético, o romance, o inusitado de trabalhar o mito indígena como teatro e como comédia.

jjLeandroComo o senhor vê o enfoque da peça com o grupo Ciganu’s voltado para todas as faixas etárias e não somente ao público infanto-juvenil? E a relevância de uma abordagem atual como ecologia e meio ambiente?
Márcio Souza – O sapo também é apresentado para todo mundo. Nós estamos com uma montagem agora lá em Manaus, e temos apresentado para platéias de todas as idades, de oito a oitenta anos. A temática do meio ambiente não é parte aberta do espetáculo. Está implícito isso na medida em que o próprio mito trata da relação homem/natureza, da civilização. De fato, eles fazem uma encenação e não uma adaptação. E esses temas já estão subjacentes na peça.

jjLeandroO senhor aborda muito a temática da região Norte em seus trabalhos. A tetralogia sobre as crônicas do Grão-Pará explora essa temática e o senhor já disse que a Cabanagem tem material para milhares de romances. O senhor acredita que o tema histórico no Brasil é explorado satisfatoriamente?
Márcio Souza– Hoje não é muito do interesse dos escritores trabalharem isso. Primeiro porque a literatura brasileira na sua maioria hoje, com honrosas exceções, é uma literatura subjetiva que tem mais a ver com as experiências pessoais dos autores. É uma literatura reflexiva. Naturalmente, a literatura que trabalha com temas históricos é muito mais ampla, de ação em muitos casos, que leva os leitores ao passado e a partir daí faz uma reflexão sobre o presente. Diria até que há certo preconceito contra o romance histórico no Brasil. Não é da moda...

jjLeandroIsso é positivo ou negativo?
Márcio Souza – Não faz a menor diferença para a literatura. É negativo para os leitores, porque a divulgação da literatura no Brasil - seja brasileira ou estrangeira - tem um espaço muito limitado. Você compara com trinta anos atrás, a literatura tinha muito mais espaço no jornal impresso, na rádio, e hoje não tem mais espaço. E aí, quando surge um preconceito contra um dos nichos de narrativa, é muito ruim para a divulgação da própria literatura.

jjLeandroComo autor consagrado, o senhor acha que exista uma fórmula para o autor inédito que procura reconhecimento e leitores para sua obra?
Márcio Souza – Acho que não. Acho que ele tem que ser perseverante, escrevendo. O primeiro cuidado dele é não editar, se ele não está no eixo Rio-São Paulo, na sua cidade, pois aí estará apostando contra ele mesmo. Em geral, fora do eixo Rio-São Paulo não tem profissionais com capacidade de distribuir o livro. Mesmo no eixo Rio-São Paulo a distribuição já é precária no país pela suas dimensões continentais. E são poucas as editores que atingem todo o país. Mas, se ele quer começar de alguma maneira, tentar ser conhecido, ele tem que lutar para ser publicado por uma editora paulista ou carioca.

jjLeandroO brasileiro tem um bom índice de leitura? Ele lê bem?
Márcio Souza - O Brasil tem os piores índices de leitura. Mas eu acho que não é o leitor brasileiro que não lê bem. Há uma demanda reprimida no Brasil pela carência de bibliotecas públicas. O preço do livro é muito alto para o poder aquisitivo do brasileiro. Na verdade não é o livro que é caro. O brasileiro ganha mal, nós ganhamos mal. Então tudo isso limita o acesso. Quando ocorreram fatos que melhorou um pouco o poder aquisitivo da população, as vendas dos livros aumentaram no Brasil. Isso ocorreu umas três ou quatro vezes na segunda metade do século XX. Portanto, comprovadamente do ponto de vista econômico, o brasileiro não tem acesso porque ele é pobre e o Estado não oferece alternativa.

jjLeandroObviamente o autor também é prejudicado.
Márcio Souza – É claro. Você escreve e publica num país que os leitores não têm acesso a livros...É uma situação kafkiana.


jjLeandro

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