domingo, 1 de abril de 2007

UM CHEFE TAMOIO VEM DO PASSADO


Lagoa Sacopenapan - Rodrigo de Freitas (http://www.almacarioca.com.br/imagem/fotos/capital/cidade05.jpg- Dir. Reservados)

ESSA CRÔNICA NASCEU DA FASCINANTE HISTÓRIA DOS ÍNDIOS TUPINAMBÁ E A FANTÁSTICA CONFEDERAÇÃO DOS TAMOIOS, A PRIMEIRA NAÇÃO PINDORAMA NA ERA DA INVASÃO PORTUGUESA NA AMÉRICA

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AIMBERÊ NO RIO DO SÉCULO XXI

Aimberê desceu no Rio do século XXI direto de uma nave espacial, e não me perguntem como isso aconteceu que nesses tempos high tech tudo é possível, até apagão aéreo (dão sorte, pois o referido acontece no chão – já pensou o piloto dizendo: “senhoras e senhores, apagão aéreo a 10 mil pés de galinha. Vamos direto para o chão, com a sorte dos 154 coitados!” seria muito pior –, mas ainda assim reclamam!). Bom, mas cadê o Aimberê? Ah! Tá ali, comprando um terno Armani, que andar nu por esse Rio, oitava maravilha do mundo, dá cana e é mais perigoso que bala perdida.
Orou rapidamente no calçadão de Copacabana com sol a pino pra Tupã, para que protegesse os seus e a si mesmo. Mas aquele homem alto, acentuada cara de tamoio, uma gravata Gucci no pescoço e várias outras com desenhos de palmeiras no bolso, compradas em Miami (ele não toma remédios tarja-preta automedicados, e por isso não tem ‘transtorno inexplicável’). Mas chamou atenção de muitos canais de tv e jornais, ávidos em surrupiar audiência umas às outras e meter goela abaixo dos leitores um medo de que perdidos somos nós, pois a bala é certa! Foi rodeado pelos senhores da mídia. Sua primeira reação, pois não sabia do que se tratava foi dizer: “Não surrupiei nenhuma gravata! Isso aqui foi escambo com mairs e perós” E iam eles entender patavinas do que o chefe tamoio falava? Eles para o morubixaba: “Quem é o senhor?” E não é que ele entendeu o português? “Eu sou Aimberê, morubixaba tamoio, dono de tudo isso aqui. Pindorama me pertence!” Os repórteres riram em sua cara, como ele não entendeu por que, riu também. Passaram meia hora rindo (o chefe de edição faria os cortes). Depois sério e temeroso, ele perguntou: “Cadê os perós? Há portugueses por aqui?” A laia de repórteres falou: “Só o Manoel da padaria, ali na esquina. Mas não se incomode, ele é vascaíno e agora anda mais preocupado em saber em quem o Romário fará o milésimo gol”. Despreocupou-se: a rivalidade perós/tupiniquins x mairs/tupinambás era tão antiga quanto o hábito de traficar nessa terra: o primeiro foi com o pau-brasil. Atualmente, a grande moda é o tráfico político.
Aimberê andou pela rua e a chusma atrás. Deu uma volta pela Lagoa Sacopenapan ou Piraguá (Rodrigo de Freitas) e espantou-se com os espigões por ali. Gritou, chorando: “Salema! Salema!” Os repórteres repetiram o nome, achando que era um grito de guerra, não sabiam que esconjurava o mouro Antônio de Salema, governador do Rio naqueles tempos de cobiça que, para surrupiar as terras aos tamoios em volta da lagoa, distribuiu pela sua orla roupas de etiqueta que os desavisados tamoios vestiram. Morreram todos de varíola, pois as roupas eram de defuntos vitimados pela doença. E Salema, o mouro, esperto que era, pôde construir seu engenho de cana ali, que naquele tempo isso dava mais dinheiro que o tráfico de drogas. Nascia então no Novo Mundo técnicas avançadas de combate e extermínio em massa: a temida guerra bacteriológica, melhor que mil tiros de arcabuz.
Antes de correr ao morro Cara de Cão para dar um soco no focinho de Salema, vociferou contra o carrasco português: “Se te pego, te mato; te mando algumas flores e depois escapo!”, fazendo uso do refrão de uma antiga ária do cantor Sidnei Mingal muito em voga em seu tempo. Mas qual, Salema não estava mais lá desde há muito, a cidade havia sido transferida por Men de Sá após a morte de Estácio no Carnaval por overdose de coca (nunca gostou do sabor adocicado da pepsi), para o morro do Castelo.
Os repórteres na cola. Correu toda a orla chique montado num tapir e chorou de raiva, só havia gringos. “Os perós tomaram conta!” lamentou. “O que é tudo aquilo?”, perguntou aos repórteres. “Favela!” disseram. E emendaram: “Uma maneira de morarem apinhados e próximos da orla”. “E esse monte de perós gritando e carregando pendões nessas ubás com cobertura?”, intrigou-se. “Ah! São flamenguistas embandeirados indo ao clássico contra o Vasco. E não são ubás, são ônibus. Hoje o Romário pode fazer o milésimo gol, vamos ao estádio? Lhe levamos lá.” E Aimberê topou conhecer a brincadeira. Montou no seu tapir, e os repórteres na frente em suas vans indicando-lhe o caminho pelo meio da selva de pedra. Uns malandros roubaram-lhe o tapir no estacionamento pois ele esqueceu de ligar o alarme. Mas há males que vêm para o bem, afinal o Ibama já se preparava para multá-lo por tráfico de animais silvestres. O animal foi moqueado num dos morros, como são os churrascos de hoje, que a gente aprendeu a fazer tão bem quanto os tupinambás e tupiniquins, que se comiam (gastronomicamente) uns aos outros, dizendo: “Iguatu! Muito bom. Muito bom!”
Na peleja em campo, que animou Aimberê, lembrou-se das contendas contra perós e tupiniquins no seu tempo. Torceu para o Flamengo, pois Vasco é bacalhau e português, e um tamoio odeia portugueses e ama os mairs franceses. Ficou feliz porque Romário não fez seu milésimo gol, e foi embora sorridente porque os perós vascaínos saíram tristes do Maracanã. Ao menos dessa vez os tamoios sorriram. Em sua entrevista de despedida aos repórteres falou de seus planos para o futuro: iria convidar Coaquira, Pindobuçu, Cunhambebe e outros morubixabas para serem caciques de um time que pretendia fundar para toda a nação indígena brincar. “Já tem nome?”, perguntaram os repórteres. “Sim”, disse na lata. “E qual é?” “Guarani”, respondeu convicto. Os repórteres fizeram cara de mofa e grunhiram baixinho entre dentes: “Xiii, péssima escolha. Esse é saco de pancadas na terceira divisão”. Aimberê voltou feliz para a sua terra cantando um velho samba de um cantor que mudou de nome e está com seu cavalo procurando o dragão em Jaci: “No Flamengo existe uma nega chamada Tereza...”

jjLeandro

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