domingo, 21 de setembro de 2008

Não só há reta

Entre um ponto e outro.

Cuide-se em não
Se perder nas muitas vírgulas.



jjLeandro

sábado, 20 de setembro de 2008

AQUELA PONTE

Eu sempre olhei a ponte
Diante de minha janela
Com desconfiança.
É absurdamente grande,
Tão grande que atravessa o golfo
No mar
E não permite – numa ação de força -
Que os dois braços de terra se afastem.
Quando nasci já estava ali,
E temo que continue lá após mim.
Parece uma cobra a minha espreita.
Nunca dormi com a janela
Aberta, ainda que precise
Da brisa do mar
Para amenizar o calor
Nos dias de verão.
Não confio em quem
Guarda perpétuo silêncio.
E ela – quando muito –
Só emite grunhidos
Quando pesam sobre si
Os vagões de operários do trem da madrugada.
Ela some dentro da chuva torrencial
E então me invade
A esperança de que desapareça.
Mas quá!
Brilha em delírio após o temporal,
Lavada em sua alma metálica.
Não confio também
Em quem não acalenta flores
E dá lhufas ao asseio corporal.
Sobre o metal rígido da ponte
Os pássaros cagam o dia inteiro
E a fuligem de carros e trens
Que têm intimidade com ela
Camuflam com imundícies a
Sua verdadeira cor.
Ainda assim há homens
Que passeiam sobre ela
A pé, em bicicletas, em carrocinhas
Puxadas a cavalo nas frescas manhãs
Dos finais de semana
Beijando suas apaixonadas companheiras.
Desconfio que esteja ali só por minha causa.
Nunca ofendeu outrem
E creio que espera com isso me atrair.
Serei como meu pai
Que também habitava a colina
E me dizia sempre, até que a odiei,
Que a viu nascer
De um parto asqueroso,
Assistido por mil operários
Que manipulavam suas vigas de aço
Como ossos de um esqueleto.
“Um desprezível progresso”, opôs
Meu pai. Nunca a pisou, preferindo
Dar a volta na colina. Segui-lhe os passos.
Quando morreu, levei-o de barco através da baía
Ao cemitério do outro lado.
Quero fazer o mesmo roteiro
Quando for encontrá-lo.
Mas temo que meus filhos -
Que renegaram o ódio
À grande cobra - se apressem
Em me levar por ela.
Não quero que sinta o gosto supremo
Da vitória no ato derradeiro de minha
Vida.
Estou agora à espera do corretor para a venda da casa.
Em pouco tempo não mais porei os olhos sobre ela
E poderei dormir tranquilamente com a janela aberta.


jjLeandro
Uma companheira aziaga

A morte que me espreita
Todo dia
Deita comigo
Pois é impossível
Negar-lhe abrigo.

Sei que é hábil nas contas.
Enquanto durmo,
Silenciosa desconta
Os dias a menos
Nesta vida.

E se acordo radiante,
Revitalizado pelo sono,
Caçoa de mim
Como de uma criança
Sem qualquer disfarce.

E enquanto sorrio alegre
Ela acrescenta sem que eu sinta
Mais marcas suas em minha face.


jjLeandro